Era
uma criança, uma menina, uma mocinha; sonhava alto, alto no romance
tradicional, sonhava em ser independente, em morar sozinha, ter um amor
para sair à noite, dormirmos juntos e no outro dia eu continuar na minha
casa sozinha à espera dele para mais uma noite sensacional. Sonhava
muito, sonhava demais, sonhei tanto que me perdi nos sonhos. Fui
sonhando, andei degraus, continuava sonhando, fui subindo, subindo, subindo...
Até que um dia despertei do sonho e lá estava ela, crescida,
amadurecida, sofrida, cheia de problemas, fria, desapegada, infeliz, sem
futuro, sem destino, sem saída. Eu a vi e não quis aceitá-la. Não, me
neguei a aceitar que ela, logo ela que sonhou tanto estivesse daquele
jeito. Ela era eu. Um modo de mim que não me pertencia, um modo que eu
não queria enxergar e tinha medo do que pudesse se tornar. Eu lutei.
Lutei, pois duvidei que eu, menina imatura, alegre, cheia de esperanças,
carinhosa, apegada, feliz, com um futuro brilhante, com o destino
traçado e com uma bela história por construir, estivesse tão distante de
mim mesma. Fui lutando e luto até hoje.
Quero ocupar os espaços vazios,
quero superar os defeitos desse meu outro lado, quero tentar viver como
uma menina em um mundo onde meninas não são mais aceitas. Brigo todos
os dias para me definir de uma vez, sinto-me aprisionada a tantos
defeitos e qualidades, que um vive superando o outro a todo instante, e é
nesse meio termo que as pessoas me desconhecem, um dia sou fogo no
outro gelo, um dia sou flores no outro espinho, um dia sou sorrisos no
outras lágrimas, um dia sou carente no outro autossuficiente, um dia sou
sorte no outro azar. Foi esse o motivo que fez eu finalmente perceber
que ninguém conseguirá entender o meu jeito, nem aceitá-lo, foi aí que
eu coloquei o coração para hibernar. Tá aí, pela primeira vez estou
dando razão a aquela parte de mim que eu luto em rejeitar, a parte de
mim que se perdeu em meio aos meus sonhos.
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